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01/08/2016

ECOS de Durban: à procura do próximo ‘Paciente de Berlim’, médicos documentam receptores de medula

 

Gus Cairns, aidsmap, 01 de agosto de 2016 (*)

Traduzido e adaptado por J. Beloqui (GIV, ABIA, RNP+)

 

O ‘paciente de Berlin’, Timothy Ray Brown, já sobreviveu sete anos sem uso de terapia antirretroviral e sem o reaparecimento de nenhum sinal de HIV em seu corpo, e com o passar do tempo, sua posição como “a pessoa curada do HIV” torna-se mais segura.

O Simpósio Em direção à Cura 2016, realizado antes da 21ª Conferência Internacional de AIDS (AIDS 2016), no entanto, ouviu falar do trabalho de um consórcio de médicos e pesquisadores que estão procurando, e documentando, a história de pacientes com HIV que, como Timothy Brown, foram submetidos a transplantes de células-tronco, em um esforço para abolir a distinção de Brown como a única pessoa a ser curada do HIV.

Houve decepções ao longo do caminho: em 2013 pareceu que pudéssemos ter mais duas pessoas receptoras de transplante de células-tronco controlando o HIV sem tratamento, mas houve decepção quando, em 2014, foi revelado que em ambos os casos, a carga viral delas havia reaparecido .

Transplante de células tronco
O transplante de células tronco quase certamente nunca será uma opção de cura para a maioria das pessoas com HIV. É um procedimento de alto risco, uma vez que envolve basicamente eliminar ou quase eliminar o sistema imunitário do paciente com radioterapia e quimioterapia. É apenas uma opção de último recurso em pacientes com câncer do sistema imunitário, como linfoma e leucemia. Brown mesmo quase morreu nesse procedimento.

Após a ablação (ou retirada) das células do sistema imunológico do paciente, elas são substituídas por uma doação de células tronco, que são as progenitoras de todas as outras células do sistema imunológico. Estas células vêm tanto de células da medula óssea de doadores adultos, ou de células tronco encontradas no sangue retirado do cordão umbilical de recém-nascidos, que têm delas em abundância. A vantagem das células de sangue do cordão é que elas não têm que ser adaptadas geneticamente aos seus receptores; já as células de adultos devem ser adaptadas, para evitar a rejeição.

Em alguns casos, incluindo o de Brown, as células do doador vieram do 1,0 a 1,5% de pessoas do Norte da Europa (e menos de 0,2% em outros lugares) que têm a assim chamada mutação de dupla exclusão do receptor CCR5-32 (homozigoto), que confere resistência à infecção pelo HIV. Estas pessoas não têm o receptor CCR5 na superfície de suas células-T que a grande maioria dos vírus HIV utiliza para ligar-se de modo a infectar as células. As pessoas também podem ter a mutação de exclusão isolada (heterozigoto), que não confere imunidade ao HIV, mas leva a uma taxa mais lenta de progressão da doença em pessoas com HIV não tratadas.

Homozigoto e Heterozigoto
Na genética, os seres homozigotos possuem pares de genes alelos idênticos, enquanto que os heterozigotos caracterizam os indivíduos que possuem dois genes alelos distintos.

Genes Alelos
Antes de mais nada, é importante frisar os conceitos de genes e cromossomos, uma vez que os genes são diminutos segmentos de DNA e os cromossomos são segmentos de genes, os quais ocupam uma posição específica denominada “lócus”.

Assim, os genes alelos, responsáveis por determinarem as características biológicas dos seres, são segmentos de DNA (ácido desoxirribonucleico) que encontram-se no mesmo lócus nos cromossomos homólogos sendo, sobretudo, constituídos de pares adquiridos dos progenitores: um deles é proveniente da mãe (óvulo) e outro do pai (espermatozoide). Dessa maneira, quando os genes alelos são iguais denomina-se “homozigotos” e quando diferentes, “heterozigotos“.

 

Não é claro que esta seja uma condição necessária para uma cura de HIV: outra teoria é que um fenômeno chamado de doença do enxerto-versus-hospedeiro pode ser necessário. Neste fenômeno, as células do enxerto destroem as células restantes da medula do hospedeiro. Isto normalmente é uma complicação indesejada do transplante.

O EPISTEM
O consórcio EPISTEM é um grupo de pesquisadores europeus com base em sete clínicas de cinco países. Annemarie Wensing, da Universidade de Utrecht, na Holanda disse que o EPISTEM foi configurado com quatro objetivos principais:

a. orientar os médicos sobre os procedimentos clínicos a usar em pessoas com HIV receptoras de medula óssea;
b. compartilhar os ensaios ultrasensíveis utilizados na pesquisa de cura;
c. explorar as questões éticas envolvidas nos procedimentos que poderiam curar o HIV, mas que são muito arriscados e executados em pacientes muito doentes; e
d. procurar doadores e selecioná-los para a mutação delta-32.

Cerca de 30.000 unidades de sangue do cordão umbilical em vários bancos de sangue européus e mais de um milhão de doadores adultos foram genotipados para o CCR5 com a finalidade de gerar um registro de doadores disponíveis com a mutação CCR5-32.

O outro objetivo é estudar pacientes que receberam ou estão sendo considerados para o transplante de células-tronco e avaliar suas respostas virais.

Pacientes identificados pelo EPISTEM
EPISTEM identificou 24 pacientes até agora, 15 foram submetidos a transplantes, provenientes da Alemanha, Bélgica, Canadá, Espanha, Holanda, Itália e Reino Unido. Há outros pacientes possíveis identificados no Brasil, Sérvia e Suécia.

Para sublinhar o quanto doentes estão esses pacientes, e da gravidade da decisão de dar-lhes um transplante, apenas seis dos 15 pacientes estão atualmente vivos. No prazo de quatro meses, oito morreram após a recepção do transplante e outro, 2,5 anos depois. Os pacientes morrem diretamente de câncer descontrolado ou de infecções oportunistas provocadas pela supressão imunitária pré e pós transplante.

Dos seis atualmente vivos, um deles está vivo cinco meses após o transplante, outro 14 meses depois, três cerca de três anos depois, e um cinco anos após. Todos eles mostram sinais de DNA do HIV muito baixo em suas células, como aconteceu com a maioria dos pacientes que não sobreviveram.

Pacientes HIV-positivos típicos que iniciam a terapia antirretroviral experimentam um declínio no DNA do HIV nos linfócitos do sangue (a classe de células que inclui as células-T) numa média de 900 a cerca de 400 cópias por milhão de células durante os primeiros anos, mas rapidamente alcançam um equilíbrio e não diminuem mais.

Nos indivíduos há grande variabilidade natural na quantidade de DNA do HIV “semeado” nas células e, nos 15 doentes EPISTEM, a quantidade de RNA no primeiro dia variou de duas a 2000 cópias por milhão de células. No entanto, três meses após o transplante (a maioria ainda estava viva nesse ponto), quase todos não tinham DNA do HIV mensurável em suas células (ou seja, menos do que uma cópia por milhão de células) e, depois de 200 dias, houve apenas uma leitura detectável de DNA em todos os pacientes.

Apenas dois desses seis pacientes tiveram transplantes de células com a mutação dupla CCR5-32; os outros quatro foram de “tipo selvagem”.

Pacientes com mais tempo de sobrevivência
A Dra. Wensing revisou os três pacientes de maior tempo de sobrevivência em detalhe: dois que sobreviveram mais de três anos após o transplante e um mais de cinco anos. Um deles recebeu células-tronco do sangue de cordão e os outros dois células da medula óssea de doador compatível.  Os dois receptores de células de doador compatível, um com a mutação CCR5-32, e outro com células do tipo selvagem, têm DNA do HIV indetectável em todas as amostras.

Suspensão de terapia antirretroviral
Até agora, no entanto, nenhum suspendeu a terapia antirretroviral (TAR). Tal como acontece com outro estudo apresentado no Simpósio da Cura de mulheres tratadas bem no início da infecção, este será o momento crucial quando será observado se os pacientes podem controlar o HIV sem TAR, ou se ainda têm algum HIV.

Nós estamos, claramente, esperando outro Timothy Ray Brown. Seria ainda mais emocionante se o destinatário do tipo selvagem ficasse indetectável após a interrupção do tratamento, mas os pesquisadores ainda não estabeleceram critérios definidos ou uma data para parar.

Referência:
Wensing AM et al. Allogeneic stem cell transplantation in HIV-1-infected individuals; the EPISTEM consortium. Towards a Cure Symposium, 21st International AIDS Conference, Durban, abstract OA3-1, 2016.

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