Não nos deixemos enganar: ativistas da saúde global enfrentam a indústria farmacêutica contra os altos preços dos medicamentos.
O Dia da Mentira está sendo marcado por ativistas de todo o mundo em protesto contra a ganância da indústria farmacêutica. O preço dos medicamentos essenciais à saúde de pessoas com HIV, com câncer, hepatites e outras tantas doenças foi considerado exorbitante por mais de 25 grupos que atuam na promoção da saúde em todos os continentes do planeta.
Se no Brasil, o 1º de Abril é o dia da mentira, em muitos países é o dia dos bobos, tolos ou inocentes. Por isso, bem apropriado para chamar a atenção da sociedade e dos governos sobre os preços dos medicamentos e da falta de transparência em torno dos custos de pesquisa e desenvolvimento (P&D).
Em todo o mundo está havendo protestos contra Pfizer, Gilead, Roche, Produtores Farmacêuticos da América (PhRMA) e o Centro de Tufts para o estudo do desenvolvimento de fármacos e pesquisas. Em Brasília, o Secretário Nacional de Articulação Política da RNP+ Brasil, Vando Oliveira (de vermelho, na foto), participou do ato de lançamento da Campanha Interfarma/Caeme larguem o caso!, para pressionar a associação de farmacêuticas que atua no Brasil (veja abaixo).
A reivindicação exige:
- FIM dos preços injustos dos medicamentos;
- FIM da evasão fiscal corporativa através do uso de paraísos fiscais no estrangeiro;
- FIM do engano sobre o custo de P&D.
Ao invés disso, queremos que todos os países utilizem as salvaguardas da Saúde Pública para garantir melhor acesso aos medicamentos e um acordo global de P&D que assegure melhor inovação de medicamentos.
“Os cidadãos não continuarão a ser enganados pelas grandes farmacêuticas. Não há casos atípicos na especulação de preços dos medicamentos. Juntos nos levantamento contra as práticas abusivas da indústria mundial de fármacos, que segue deixando milhões de pessoas sem acesso aos medicamentos vitais de que necessitam”, afirma Luis Santiago, de ACT UP.
Mundialmente, mais de dois bilhões de pessoas necessitam de acesso regular aos medicamentos essenciais que necessitam. Isso significa um terço da população mundial. Mais da metade destas pessoas vivem na Ásia e África. A cada ano, 10 milhões de pessoas morrem por causa de doenças porque o acesso a tratamentos efetivos está bloqueado pelo preço dos medicamentos.
Entre os motivos que causam tantas mortes está o alto custo dos medicamentos protegidos por patentes. Outro, é a recusa de encarar doenças como a aids em contextos de pobreza, desnutrição e demais fatores materiais. Não há epidemia sem associação com os problemas sociais.
A indústria farmacêutica justifica os altos preços argumentando que o custo de P&D de um fármaco está na faixa dos 2,9 bilhões de dólares. A organização independente Drogas para Doenças Negligenciadas (DNDI, na sigla em inglês) informou recentemente que os novos medicamentos podem ser desenvolvidos por menos de 200 milhões de dólares, incluindo o custo de ensaios clínicos e de medicamentos falidos. Contra a indústria farmacêutica, Andrew Witty, conselheiro de GlaxoSmithKline afirma que a posição corporativa sobre os custos de P&D é “um dos grandes mitos da indústria”.
Um caso brasileiro
Em fevereiro, a RNP+ Brasil enviou carta à Gilead Sciences, nos EUA, e à Gilead Brasil. No documento, a RNP+ parabenizou a farmacêutica pelo registro dos medicamentos elvitegravir / cobicistat / emtricitabina / tenofovir alafenamida em uma única composição, no FDA, departamento norte-americano semelhante à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) no Brasil. Além de parabenizar a Gilead, a RNP+ pediu o registro das mesmas drogas no País, separadamente e em conjunto, como nos EUA.
A Gilead informou à RNP+ que além da combinação de elvitegravir / cobicistat / emtricitabina / tenofovir alafenamida (TAF), à qual patenteou com o nome Genvoya(®), o FDA também havia registrado a combinação de rilpivirina / emtricitabina / tenofovir alafenamida (TAF), à qual patenteou com o nome Odefsey(®). Informou, ainda, que além do Genvoya(®) e do Odefsey(®), também dará início, no Brasil, ao pedido de registro da emtricitabina / tenofovir alafenamida (TAF).
A farmacêutica reforçou seu “princípio básico de prover acesso aos nossos produtos para os pacientes que deles necessitem, independente de onde vivam ou de sua condição socioeconômica”. Mas, ao afirmar que “o Brasil tem um dos mais amplos e efetivos programas públicos de acesso ao tratamento de portadores do vírus HIV”, também teve de constatar que o País tem ainda “o desafio de tratar um número crescente de novos casos”, sobretudo entre a população mais jovem, tem de “tratar pacientes que estão envelhecendo em vigência de seu tratamento”. Segundo a farmacêutica, esses pontos vêm “criando situações especiais que requerem uma abordagem mais individualizada a estas necessidades”.
A abordagem individualizada, pensando nas pessoas com HIV que talvez desenvolvam ou tenham desenvolvido resistência a um dos medicamentos das combinações Genvoya(®) e Odefsey(®) não poderão fazer uso de um deles em separado. A RNP+ expôs este raciocínio à Gilead em nova carta, mas ainda não obteve resposta.
Quanto custa produzir e desenvolver um medicamento
Em Boston (EUA), ativistas estão protestando contra a Universidade Tufts e contra o professor Joseph DiMasi pela falta de transparência nos seus estudos, respaldados pela indústria, que induzem a cidadania a erros sobre tais custos de P&D.
As companhias farmacêuticas gastam mais em marketing dos que em P&D. Na maioria dos casos, os gastos em publicidade custam mais que o dobro do investido em P&D. As primeiras etapas de pesquisa em medicina são frequentemente por governos, organizações filantrópicas, universidades e por cientistas independentes. No entanto, as grandes farmacêuticas controlam o preço final e obtém os benefícios de todo o processo. O preço final não está relacionado com o custo de fabricação. Por exemplo, produzir um tratamento de 12 semanas para os novos medicamentos para a hepatite C custa entre 60 e 270 dólares. Mas, tem preço de 84 mil dólares nos EUA.
“No lugar de estabelecer um preço razoável em função dos custos de P&D, frequentemente os preços são estabelecidos em função da quantidade de benefícios que se pode obter das pessoas doentes e, muitas vezes, desesperadas”, adverte Anele Yawa, da Campanha de Ação por Tratamento.
Merith Basey, diretora executiva da Aliança de Universidades por Medicamentos Essenciais (UAEM) é enfática: “A cidadania não deveria ser enganada nem pagar várias vezes por uma pesquisa médica que ajudou a financiar e que, ao final, termina em um produto fora do alcance das pessoas por culpa das grandes empresas farmacêuticas. O sistema não tem que funcionar desta maneira: temos o poder para reclamar por uma pesquisa que seja de interesse público.”
Além disso, os governos deveriam produzir e distribuir medicamentos genéricos com mais facilidade, sem quebrar as leis de propriedade intelectual, já que frequentemente estas resultam em altos preços que obrigam aos países a restringir a elegibilidade dos medicamentos eficazes que previnem, controlam ou curam enfermidades como o câncer, a aids, a tuberculose e a hepatite C, entre outras.
Conclamamos os governos a darem prioridade à saúde das pessoas antes de dar benefícios às empresas farmacêuticas. Os governos, por meio do trabalho de articulação na Reunião de Alto Nível (RAN) das Nações Unidas sobre acesso a medicamentos, têm a oportunidade histórica de mudar a forma que se deve financiar a P&D dos novos medicamentos. Há alternativas viáveis ao atual sistema baseado nas patentes. Estes modelos alternativos serviriam para aumentar a inversão em P&D para obter maior acesso a tratamentos.
Demandas gerais
NÃO SE DEIXE ENGANAR: não há justificativa razoável para a fixação de preços excessivos em medicina. Estamos unidos ao redor do mundo para exigir medicamentos de qualidade e baixo custo, vacinas e diagnósticos. Conclamamos os líderes dos governos a por a vida dos pacientes antes da cobiça da indústria, e a fazer frente à corrupção empresarial e ao engano.
Demandamos:
- Acesso aos medicamentos essenciais para salvar vidas independentemente da capacidade de pagamento do indivíduo;
- O uso das flexibilidades legais de propriedade intelectual para garantir a produção e a distribuição mais sensível de medicamentos essenciais;
- Que as companhias farmacêuticas respeitem o direitos dos países para utilizar plenamente as medidas de proteção da saúde (contemplados no Acordo TRIPS) e retirar todos os casos judiciais que questionam a aplicação de tais medidas, como atualmente na Argentina e no Brasil;
- Que nossos governos apoiem e invistam em estruturas alternativas de financiamento para P&D, tais como prêmios, ajudas e subvenções;
- Um aumento de P&D de novos medicamentos para doenças esquecidas e infecciosas, como a Doença de Chagas, o Ebola, a tuberculose, ou o Zika vírus;
- A nossos governos, que exijam transparência nos custos de P&D e de produção de fármacos;
- A nossos governos demandamos que façam cumprir licenças não exclusivas e acesso aberto sobre todos os medicamentos financiados com recursos públicos, garantindo, assim, que os medicamentos sejam para o bem público;
- Um acordo de pesquisa e desenvolvimento global vinculante, que possa gerar P&D sobre a base das necessidades de saúde em lugar das forças do mercado. O desenvolvimento de fármacos deve desvincular os custos de P&D do preço final dos medicamentos;
- Que nossos governos se comprometam plenamente e apoiem o trabalho da Reunião de Alto Nível do Secretário Geral da ONU sobre acesso a medicamentos, e que esta Reunião se posicione pelo direito à vida e à saúde antes dos interesses privados das companhias farmacêuticas.
Como ajudar?
Se você considera justas as reivindicações globais à indústria farmacêutica, especialmente que a Interfarma no Brasil e a Câmara Argentina de Especialidades Médicas (Caeme) retirem os processos judiciais junte-se à Campanha Interfarma/Caeme larguem o caso! e assine a petição conjunta de Brasil e Argentina.
Para assinar as petições mundiais, acesse
http://www.afairshot.org e https://uaem.wufoo.com/forms/make-medicines-for-people-not-for-profit/
Para saber mais sobre a campanha global acesse www.pharmagreedkill.com ou envie um email para pharmagreedkill@gmail.com
Para outras informações:
Washington: Alexandra Greenberg (Universities Allied for Essential Medicines); Tel: (917) 733-7997; ali@uaem.org
Nova York: ACT UP New York info@actupny.com; Tel: (929) 248-8252 or (954) 482-1421; Twitter: @actupny
França: ACT UP Paris communication@actupparis.org; Twitter: @actupparis
África do Sul: Lotti Rutter (Treatment Action Campaign) lotti.rutter@tac.org.za; Tel: +27 81 818 8493; Twitter: @TAC and @FixPatentLaw
Reino Unido: ACT UP London actuplondonfighttilltheend@gmail.com Twitter: @ACTUP_LDN
Organizações participantes: